De olho no ponto futuro
Hermann Mahnke, diretor-executivo de marketing da GM para a América do Sul
Hermann Mahnke, diretor-executivo de marketing da GM para a América do Sul
Renato Rogenski
Para toda a indústria automotiva, a pandemia que impactou o mundo nos últimos meses ajudou a acelerar tendências em produtos e serviços, mas também trouxe novos problemas. Olhando o contexto nacional, esse abalo tem acometido principalmente a Chevrolet, que precisou paralisar a produção do Ônix, carro mais vendido do País, pela escassez dos semicondutores, componente essencial para a fabricação de qualquer produto eletrônico. Apesar disso, a companhia caminha a passos largos com seu plano de eletrificação, com o desenvolvimento de novas baterias, ao mesmo tempo em que prepara terreno para o lançamento da nova versão do modelo elétrico Bolt no País e moderniza a comunicação com uma estratégia multicanal que inclui a estreia no TikTok, como detalha, a seguir, o diretor-executivo de marketing da GM para a América do Sul, Hermann Mahnke.
Meio & Mensagem — Quais são os grandes desafios que o mercado automotivo tem passado?
Hermann Mahnke — No começo da pandemia, o segmento parou. Todos fecharam as fábricas e as redes de concessionárias. Não tínhamos condições de produzir e o mercado não comprava. Após esse primeiro momento, voltamos em bom ritmo. Agora, no entanto, a indústria como um todo está sofrendo muito com a falta de componentes. Há uma escassez, principalmente de semicondutores, que tem limitado a indústria no mundo. Parece uma peça supersimples e de produção rápida, mas, para você produzir cada unidade, são necessárias vinte e seis semanas, principalmente pela diversidade de processos químicos. E é também uma peça usada em praticamente todos os produtos eletrônicos, não é somente carro, embora os produtos automotivos estejam cada vez mais tecnológicos. Para produzir um Ônix, por exemplo, você precisa da ordem de mil e duzentos a mil e quatrocentos semicondutores por unidade. Uma das soluções que poderíamos ter adotado seria começar a tirar conteúdo dos nossos carros, para ter um consumo menor de semicondutores. Mas acabamos optando por não utilizar esse caminho, já que houve muito esforço para conseguir posicionar o Ônix nessa posição de protagonismo tecnológico da indústria, no segmento de compactos.
M&M — Quais são as principais tendências em produtos para o mercado automotivo?
Hermann — O que a indústria automobilística começa a perceber mais e mais é que existe uma demanda muito grande por SUVs e os derivados. Nossas projeções mostram muitas coisas interessantes neste sentido, inclusive na própria América do Sul. No Chile, por exemplo, o mercado de SUVs já é maior do que o mercado de carros compactos. E estamos começando a enxergar isso em todos os mercados de maneira muito consistente. Então, o que a indústria começará a enxergar cada vez mais como oportunidade são os SUVs, os utilitários esportivos ou os CUVs. Esse é o segmento que mais cresce e essa é uma tendência mundial. Não por acaso, estamos investindo bastante na renovação do portfólio, incluindo as subsegmentações que surgiram desse crescimento expressivo. Hoje, temos o Tracker, o Equinox e a Trailblazer, por exemplo.
M&M — Estamos às vésperas do lançamento da nova versão do Bolt, carro elétrico da GM. Qual é a expectativa da empresa para essa demanda no Brasil?
Hermann — Temos claramente uma ambição muito grande, e em nível global, com foco no desenvolvimento deste mercado. Fizemos recentemente um anúncio muito importante, com o compromisso de investir US$ 35 bilhões em carros elétricos, autônomos e suas respectivas tecnologias. A tendência é que façamos uma migração substancial para esses caminhos até meados desta década, principalmente nos Estados Unidos. Até lá, a ideia é lançarmos 30 modelos totalmente elétricos, o que representará mais ou menos 40% dos nossos modelos no país norte-americano. Hoje, a grande barreira para eletrificar ainda é o custo. A bateria é muito cara. Por isso, junto com esse investimento, estamos lançando uma plataforma de baterias que chamamos de Ultium. Elas trarão diferentes combinações modulares para se adaptarem a diferentes modelos de carros e conseguirão armazenar 60% mais energia dentro de cada uma das células. E elas terão um gerenciamento totalmente wireless, autonomia de aproximadamente 700 quilômetros, com custo 40% menor, pesando 20% menos. Como a indústria automobilística não desenvolve carros por país e, sim, para o mundo, isso deve chegar ao Brasil bem rápido.
M&M — Quais são as principais tendências em serviços para o mercado automotivo? Como a empresa está caminhando para atender as demandas?
Hermann — A relação com o carro mudou muito. No passado, carro era sinônimo de status, de quem é você é e aonde você chegou na vida. Mas essa relação passional tem mudado muito. E a partir do momento em que se tem uma relação mais racional com o carro, você o enxerga muito mais como uma solução de mobilidade, que te levará do ponto A ao ponto B ou que realmente resolverá um problema doméstico e de logística. E é daí que nascem novas alternativas, novas tecnologias, novos serviços. Para ser muito sincero, diria que viraremos uma empresa de fornecimento de serviços, muito mais do que venda de carro. Isso acontecerá dentro de algumas décadas. Mas, muito do que será a indústria lá na frente, nem sequer desconfiamos. Enquanto isso, começamos a apalpar alguns terrenos, como terceirização de frota, uso de carros por quilômetros rodados e não mais por dias na locação ou ainda sistemas como a rentabilização via Uber. Mas não enxergo que esses são os serviços que vieram para ficar, ainda. Os serviços definitivos acontecerão depois da consolidação do carro autônomo.
M&M — A Chevrolet acaba de investir em uma campanha com o Carlinhos Brown para promover sua entrada no TikTok. Qual é o objetivo estratégico dessa diversificação de canais?
Hermann — Nos últimos anos, projetamos grande foco e uma energia gigantesca em performance. Viramos uma empresa que, obsessivamente, olha o dia a dia nas métricas. Entendemos, a partir disso, como performar na captação de clientes, na geração de lides e na conversão de tudo isso. Hoje, o nosso negócio está chegando em um patamar de 40% de vendas que nascem no ambiente digital, com a ajuda dessas máquinas de performance. Mas tudo isso também nos ensinou que a performance não precisa ser somente no canal da venda e que conteúdo também pode ser performance. Uma campanha não precisa, necessariamente, ser feia e direta. Ela pode ser plástica e ter uma mensagem maravilhosa. A decisão de entrar no TikTok tem dois motivos. A relevância da plataforma e sua capacidade de engajar uma audiência mais jovem, que olha de maneira especial para o entretenimento. Nessa diversificação de canais, também é um aprendizado importante entender que cada canal requer métricas bem definidas e uma performance específica e particular.
M&M — Quais são as principais tendências em comunicação e marketing para o mercado automotivo?
Hermann — Quando se fala em mensagem e narrativa, a indústria tem que vender otimismo e um futuro promissor. Passamos por tantas dificuldades nesse processo doloroso de pandemia que esse deveria ser o residual. Tudo isso misturado com um olhar muito maior não só para o nosso público, como para toda a sociedade. Temos aprendido muito e acho que ninguém é catedrático ou nasceu sabendo a respeito de temas como inclusão e diversidade, mas precisamos dar atenção a isso como sociedade. Gosto muito de interpretar a palavra “ignorância”, que é forte, às vezes, mal aplicada e que, para alguns, pode soar um pouco ofensiva. Mas, a real, é que somos todos muito ignorantes ainda em algumas pautas. Então, quanto mais humildade tivermos para trabalhar com elas, melhor seremos como indivíduo e como marca. E isso não pode ficar no discurso.
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