Transformação do modelo
Guilherme Benevides, CEO da Gafisa São Paulo, aborda as movimentações da companhia para se aparelhar como construtech, fala sobre os efeitos da pandemia na moradia e o futuro do trabalho
Guilherme Benevides, CEO da Gafisa São Paulo, aborda as movimentações da companhia para se aparelhar como construtech, fala sobre os efeitos da pandemia na moradia e o futuro do trabalho
Giovana Oréfice
Presente no mercado há mais de 60 anos, a Gafisa tem se reinventado para ressignificar paradigmas tradicionais do setor imobiliário. Desde o uso da tecnologia para a melhoria da jornada de compra do consumidor — que, assim como nos demais segmentos, também na indústria imobiliária migrou para o ambiente online —, até a navegação entre os meios físico e digital, a empresa tem aperfeiçoado a operação para reforçar sua presença em mais de 40 cidades e 19 estados no Brasil e para atender a mais de um milhão de brasileiros que moram em seus empreendimentos. Guilherme Benevides, CEO da Gafisa São Paulo, aborda as movimentações da companhia para se aparelhar como construtech, fala sobre os efeitos da pandemia na moradia e o futuro do trabalho.
Meio & Mensagem — Você pode fazer um balanço do segmento nestes 18 meses de pandemia? Quais são as perspectivas no contexto da vacinação e eventual retorno presencial?
Guilherme Benevides — Para o mercado imobiliário, a pandemia acabou trazendo uma melhora. O fato de as pessoas ficarem mais em casa fez com que revisitassem seus imóveis e isso despertou essa vontade de mudança e a valorização da questão do shelter (abrigo, em inglês). O imóvel era um item que estava virando, além de commodity, algo muito descartável no mundo. A procura aumentou em todos os níveis, desde o Minha Casa Minha Vida até os móveis de altíssimo padrão onde as pessoas, por mais que tenham recursos e já tenham imóveis, também pensaram em ter um imóvel ainda melhor, mais bem localizado em relação à qualidade de vida. Tivemos, ainda, o impulso da taxa de crédito, a menor taxa histórica neste período de crédito imobiliário que também impulsionou as pessoas a comprarem imóveis. Para o mercado imobiliário, que vinha de crise muito grande ao longo dos últimos anos, esse período de pandemia poderia ter sido ainda melhor, mas foi uma surpresa boa nesse sentido de procura e novas vendas. Entendo que soubemos aproveitar essa onda. A digitalização das empresas, a forma de abordagem aos clientes, de executar a compra e de olhar a jornada desse cliente, foi muito mais bem colocada durante a pandemia porque as empresas tinham dificuldade de ter contato físico com as pessoas e isso foi acelerado. Entendemos, no presente e no futuro, que a questão de as pessoas estarem no ambiente digital para adquirir qualquer coisa nunca mais vai mudar. Desenvolvemos um espaço físico na avenida República do Líbano, em frente ao Parque do Ibirapuera (em São Paulo, capital), em que fazemos com que a experiência do cliente seja muito mais completa e que possamos atender a essas duas situações ao mesmo tempo. Para o futuro, acho que teremos uma melhora dessa fusão do digital com o físico. As pessoas se movimentarão fisicamente, mas não abrirão mão da experiência digital.
M&M — Como tem sido o processo de transformação digital da Gafisa?
Benevides — Historicamente, a Gafisa, ao longo dos seus sessenta e sete anos, sempre foi uma empresa pioneira. A visão da nova gestão da companhia, que entrou há dois anos, é de que a Gafisa deve se transformar em grande plataforma de produtos e serviços imobiliários. A pandemia apressou esse processo e fez com que acelerássemos em todos os sentidos, da decisão de conselho ao comitê, da captação de recursos às estratégias, todos estão voltados para alcançar esse objetivo. A Gafisa não se posiciona mais no mercado como construtora e incorporadora, e sim como plataforma de produtos e serviços imobiliários que captura toda a jornada do cliente. O consumidor compra um imóvel e fica muitos anos na carteira. Assim, é possível acompanhar o crescimento da vida dele e toda essa jornada, e o mercado não captura valor nisso. É nesse ponto que estamos atuando: em capturar valor na jornada da vida do cliente conosco, podendo oferecer todas as soluções possíveis que permeiam um imóvel, seja seguro, financiamento, mudança, decoração, reforma, troca de um imóvel para o outro, refinanciamento, serviços de locação, condomínio ou de qualquer tipo na unidade em que mora. É onde queremos atuar e onde entendemos que está a nova estratégia da companhia: ser solução imobiliária para tudo o que permeia um imóvel.
M&M — Como a comunicação da empresa evoluiu e como ocorreu a descentralização da veiculação de anúncios tradicionais para o setor imobiliário?
Benevides — O mercado imobiliário é super tradicional e sempre foi um dos maiores anunciantes de jornal e revista. Não achamos que temos que parar com isso. Entendemos que temos que estar em todos os meios. Nossos investimentos no online são infinitamente maiores do que no off-line. Basicamente, 90% do que fazemos é online, tanto nas plataformas verticais focadas no mercado quanto em plataformas que falam com o cliente e que tenham e atraiam o lifestyle dele. Estamos nos posicionando também como empresa mais voltada ao luxo em vez de atender a todos os ramos. O posicionamento na mídia caminha para um mercado mais para o luxo, médio-alto e alto padrão. Tudo também é omnichannel, estar no off-line é também estar no online, mas sabemos que a mídia off-line ainda é importante. Via Facebook, Instagram e outras ferramentas, conseguimos saber exatamente onde, quando e quem queremos atingir. Estamos em todas as mídias digitais, verticais e não verticais e investimos muito na plataforma do Google também. O controle interno do trabalho de mídia online é muito presente e forte. Todo mês medimos tudo o que está acontecendo para saber o que o budget atingiu e, assim, remodelamos a atuação do mês. O meio online é muito mutável – e essa também é a magia: poder mudar a qualquer momento. Temos equipe focada em dados que faz todo o gerenciamento de dados externos e internos. Estamos olhando esses dados a todo momento para entender para qual direção usaremos nossos recursos para atingir o máximo possível de conversão em venda.
M&M — Qual agência cuida do branding e comunicação da Gafisa?
Benevides — Temos algumas frentes de trabalho. Com a Ana Couto, que é algo fantástico, uma metodologia incrível, fizemos um trabalho de marca para essa nova Gafisa e estamos iniciando campanha institucional com a Archote. Utilizamos várias agências. Inclusive, fazemos muita concorrência. Gostamos e achamos saudável fazer isso, principalmente para produtos. Sempre que há um lançamento, fazemos concorrência com três agências para abrir o leque de ideias e de oportunidades. Existem dois pilares muito fortes que permeiam a comunicação da Gafisa. Um deles é o ESG (práticas ambientais, sociais e de governança). Estamos muito ligados no social, ambiental, na governança. Temos todas as metas muito bem definidas e medidas todos os meses. No pilar de inovação — e quando falo inovação, é de dentro para fora, em relação à operação da Gafisa, criamos o programa Inova Gafisa, que incentiva que todas as ideias inovadoras, tecnológicas ou não, sejam postadas em ambiente eletrônico onde um funil é aplicado e as ideias são testadas e colocadas em prática. Um exemplo que tem a ver com publicidade: estamos terminando um trabalho de gamificação de um produto. É um produto jovem e descolado que será oferecido para o possível cliente, em que ele poderá navegar como um videogame por todo o projeto.
M&M — Qual é a intensidade de uso de tecnologias como inteligência artificial, drones, business intelligence e ferramentas de realidade virtual na Gafisa?
Benevides — Temos mais de cem iniciativas em andamento, todas voltadas para esse tipo de tecnologias. Sobre o uso de drones, estamos usando em novos negócios para mapear setores sobre os quais temos interesse em adquirir um novo negócio e saber onde é mais interessante pra Gafisa imputar uma série de dados que a inteligência artificial proporciona. Estamos na engenharia usando drones para fazer a medição dos terrenos comprados, com câmera termodinâmica para fazer inspeção de fachadas e outros itens de prédios prontos para saber precisamente se há uma fissura, qual o grau e como atacá-la. Outro tipo de tecnologia é o QR Code, que usamos para uma série de coisas como, por exemplo, para fazer a comunicação com os clientes em anúncios, cadastro nos locais físicos e para controle de manutenção dos empreendimentos. Em realidade virtual, estamos até já falando em hologramas. Temos na Casa Viver Bem, o hub que junta a tecnologia com o meio físico, o uso da IA. O reconhecimento facial pode ser usado com visitas. Estamos buscando todo tipo de tecnologia e inovação, mas no ponto certo: testando, errando, acertando e colocando em prática o que funciona.
M&M — Você pode dar detalhes sobre a plataforma Viver Bem?
Benevides — Essa plataforma está em desenvolvimento. Será uma plataforma digital, por web ou aplicativo, que permeará todos os produtos e serviços com três pilares muito fortes: a compra e venda de imóveis, novos ou usados; locação de imóveis; e financiamento. Além disso, terá serviços adjacentes a esses três pilares: seguro, reforma, mudança, decoração, compra de eletrodomésticos — tem uma série de coisas que já estamos fazendo parcerias. A ideia é que seja uma plataforma de e-commerce, onde o cliente encontre tudo relacionado ao imóvel.
M&M — Dado que o trabalho deve progredir, notadamente em serviços, para um híbrido entre home office e presencial, qual é o impacto disso quando a Gafisa faz lançamentos?
Benevides — Adaptamos bastante tudo o que está em andamento para que tenhamos espaços públicos que atendam a necessidade do home office. O cliente terá um coliving/coworking para trabalhar com tranquilidade. Estamos muito atentos para que os projetos atendam a essa necessidade de o cliente ter um trabalho híbrido entre o presencial e home office. O consumidor terá um ambiente onde pode comprar alguma coisa, por exemplo, pois temos os mini markets em todos os novos projetos. Tivemos também mudança comportamental muito grande que foram as compras online. Os empreendimentos antigos não são preparados para essa enxurrada de coisas que chegam e isso é importante em um empreendimento. Todos os projetos, agora, têm área que acomoda muito bem tanto coisas perecíveis quanto imperecíveis para que as pessoas recebam tudo que consomem de forma digital.
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